Tainhas e Camarões



       Estamos agora em plena temporada de pesca de Tainhas e Camarões na costa sul do Brasil, e aqui em Santa Catarina, esses dois frutos do mar tem uma grande importância para a cultura e economia local.
       Aí você deve estar se perguntando; O que é que Tainhas e Camarões têm a ver com o Meio Ambiente?
       Respondo: TUDO!  Como já citamos anteriormente, o Meio Ambiente é onde a vida acontece e onde ocorrem mudanças das condições existentes, sejam elas animais, vegetais ou minerais, podendo essas mudanças serem causadas naturalmente ou por ação do homem.

         A temporada de pesca das tainhas ou chamada safra, iniciou no dia 15 de maio e vai até o dia 30 de julho. Então existe um prazo de 75 dias para que a pesca seja executada de forma legal por pescadores artesanais e também pelas embarcações industriais.  (Instrução normativa IBAMA 171/2008) Após esse prazo, encerra-se essa temporada e apenas no próximo ano novamente será liberada essa captura.  A captura da tainha (Mugil Brasiliensis ou Platanus) mais abundantes na nossa costa é realizada artesanalmente através do “arrasto de praia” ou do “cerco”.  O “cerco” artesanal é realizado de aproximadamente  400 a 800 metros da praia, quando uma rede de mais ou menos 1000 metros de linha é lançado na água com o objetivo de cercar o cardume previamente avistado da costa ou da própria embarcação. O “arrasto de praia” é realizado quando o cardume está bem próximo da praia, e a rede é rapidamente levada por canoas sendo que uma das pontas fica em terra. Após o cercamento do cardume, a outra ponta levada pela canoa volta à praia e então a rede é fechada sendo arrastada para fora d’água por diversos homens em cada ponta.

           A pesca industrial se dá da mesma forma que o cerco artesanal, mas com redes muito maiores e realizadas em águas mais profundas e distantes da costa por barcos e até navios que podem até fazer o processamento do pescado capturado no local da captura.  Um dos maiores problemas da pesca atualmente realizada da tainha é o próprio calendário da pesca permitida. Como as tainhas são peixes migratórios e estão se deslocando para a desova em águas um pouco mais quentes, acabam sendo capturadas antes da desova.  Esta desova normalmente acontece em regiões de desembocadura lagunar ou fluvial (saídas de rios e lagunas). Justamente pela cultura e hábito de se consumirmos a “tainha ovada”, interferimos no processo natural de reprodução da espécie!  Dessa forma o peixe ainda não conseguiu se reproduzir, apesar de cada fêmea depositar de 2 a 4 milhões de ovas, acabando por diminuir a cada ano a quantidade e qualidade do pescado capturado.  Na idade adulta os peixes podem chegar a 1 metro de comprimento pesando 9 Kg e sua maturidade reprodutiva somente inicia após 2 ou 3 anos de vida. Hoje em dia é muito difícil conseguir a captura de espécimes desse tamanho, atualmente o normal é conseguirmos tamanhos de 50 a 60 cm com pesos variando até 3 Kg.
O ideal seria que a permissão para pesca ou safra, fosse protelado e transferido para mais dois meses à frente, permitindo dessa forma a desova natural e consequente aumento e recuperação da espécie, sendo que os peixes poderiam ser capturados quando retornam as águas Patagônicas após a desova.
Na pesca industrial a saborosa carne da tainha basicamente é direcionada ao consumo interno, ficando as ovas direcionadas à exportação para países como a França, Grécia, Itália, Espanha e Taiwan.  O preço das ovas exportadas “in natura” chegam a U$ 30,00 (trinta dólares) podendo atingir  R$ 700, 00 (setecentos reais) quando desidratada e trabalhada como caviar, recebendo o nome de Bottarga

               Esse é o motivo de associarmos a pesca da tainha ao Meio Ambiente e preservação.  É sabido que com o passar dos anos o pescado capturado é cada vez mais escasso e de menor tamanho gerando muitas reclamações e afetando diretamente a cultura e economia de toda a região onde esta pesca é realizada. Da mesma forma isso acontece com a pesca regionalizada do camarão.  Do dia 1 ° de março até 31 de maio acontece o período do “defeso” do Camarão Sete Barbas (Xiphopenaeus Kroyeri) , período no qual é proibida a captura desse crustáceo. Essa proibição também tem gerado inúmeras reclamações das comunidades pesqueiras das costas brasileiras, pois em muitos casos a captura dessa espécie é a única forma de renda de muitos pescadores, principalmente os artesanais. Dessa forma o Poder Público criou o Seguro Defeso, período no qual os pescadores recebem o valor de um salário mínimo para sua subsistência. (Lei 10.779/2003)

              O Camarão Sete Barbas é a terceira espécie mais capturada nas nossas costas, e isso acabou também por reduzir drasticamente a quantidade e qualidade do produto capturado.  O tamanho médio da espécie seria de 8 a 15 cm para adultos, variando as dimensões conforme á época do ano. Os maiores espécimes são normalmente capturados na primavera, quando ocorre a maturidade reprodutiva e desova. Desta forma seria também interessante rever o período de defeso dos camarões de forma que a reprodução e desova estivessem garantidas, proporcionando uma maior quantidade e qualidade de captura.
              A forma de captura dos camarões acontece com redes de arrasto, que provadamente são altamente predatórias, pois além de confeccionadas com malhas sem dimensionamento adequado, pela própria metodologia de utilização acabam por capturar inúmeras outras espécies, muitas em estado embrionário ou franco desenvolvimento. Nos últimos anos em diversos locais do país, estão sendo implantadas verdadeiras “fazendas de camarão” com o intuito de produção comercial garantida sem a destruição ambiental proporcionada pela forma atual de captura. A preservação de bons hábitos de captura, aliada ao respeito da cronologia de desenvolvimento e reprodução das espécies e conscientização de todos envolvidos no processo pesqueiro fará com que todos sejam beneficiados. Consumidor com pescado de qualidade e preços adequados, e profissionais da pesca com a quantidade e variedade de espécies para oferecer ao consumo garantindo assim a sua subsistência digna sem necessidade de exploração comercial exagerada.  O ser humano ganha tendo alimentos saudáveis para o consumo e a natureza ganha mantendo as espécies e quantidades asseguradas para a manutenção do ciclo da vida indispensável a todos.

     
Texto publicado na edição n° 108 dia 26/06/2014.  

2 comentários:

  1. Marcos, você foi muito lúcido no seu texto. Certamente ha detalhes a serem discutidos. Mas o indiscutível é que manter a pesca da rainha e camarões da maneira como ocorrem hoje estamos a caminho da dizimação de espécies (inclusive tartarugas que morrem nas redes de peixe e camarões todos os dias no norte catarinense sem nenhum peso na consciência de nossos pobres pescadores artesanais). Parabéns. Lute pela causa e conte com meu apoio. Passou da hora de parar de fingir que esta tudo bem e que pescadores podem tudo a qualquer custo. Não vou nem começar a falar da proibição do surfe por causa da pesca da rainha no sul do estado pois assim seria covardia argumentar contra os danos causados pela pesca das tainhas, inclusive às fontes de renda alternativas, como o turismo, que os próprios pescadores se negam a enxergar. Abraço. Gustavo Santana.

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    1. Obrigado pela visita ao meu blog! Agradeço pelas tuas colocações pertinentes e corretas! Grande abraço!

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