A água sempre desperta paixões. Desperta cobiça. Também
solidariedade e outras vezes insensatez. Segundo a teoria criacionista sua
importância foi tão grande que ela, á água, surgiu no 3° dia da criação da
terra, apenas atrás da luz e do céu. Teorias a parte sabemos que desde que há
vida no nosso planeta, a água é a motivadora dessa vida e até quando se busca
vida fora do nosso planeta a primeira preocupação é a procura por indícios da
existência dela, a água a protagonista!
Muito menos importante numa escala mundial são as águas de
Barra Velha. Desde quando a cidade foi fundada até o ano de 1975 não havia sistema de distribuição de água e muito menos
de esgotamento sanitário. Aliás, este último até hoje não está presente no
município. Então as águas para consumo urbano e rural provinham de poços e de
rios ou riachos. Em 31 de dezembro de 1970 foi criada a CASAN (Companhia
Catarinense de Águas e Saneamento) pelo então Governador Colombo Salles como
empresa de economia mista. A partir do ano de 1975 através de contrato firmado
pelo período de 30 anos a CASAN atuou na administração do sistema de saneamento
básico de Barra Velha até o ano de 2005.
Muitos problemas e discussões ocorreram ao longo desse longo
período de 30 anos de contrato e a prorrogação dele acabou não acontecendo por
uma série de demandas não atendidas pela então gestora CASAN. Assim foi criada a gestão compartilhada
nomeada de Águas de Barra Velha que atuou de 2005 a 2009 durante a gestão dos
então prefeitos Valter Marino Zimmermann (2005 a 2008) e Samir Mattar (2009 a
2012). Em 4 de agosto de 2009 por decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça)
na decisão judicial do então Ministro Rui Falcão o sistema foi municipalizado e
a gestão entregue para a Prefeitura de Barra Velha que terceirizou essa gestão
para a empresa ENOPS Engenharia até setembro de 2011. Apenas no mês de agosto de 2011 através da
Lei 115/2011, foi criado o Conselho Municipal de Saneamento Básico de Barra
Velha, órgão gestor auxiliar que com metodologia própria tem a função de
fiscalizar e auxiliar na tomada de decisões referentes ao sistema de Saneamento
Básico e Gestão de Resíduos do Município de Barra Velha.
De setembro de 2011 a dezembro de 2012 foi assinado um
convênio de 18 meses para gestão temporária e mais algumas prorrogações de
contrato após isso foram emblemáticos na exposição do imenso problema em que foi
se transformando a administração desse bem tão precioso.
Tudo isso dito e registrado com o intuito de demonstrar que
inúmeros conflitos existiram nesse período de 42 anos onde se tratou sobre a
gestão da água e esgoto no nosso município. Hoje não é diferente, enquanto
muitos acreditam que a administração de um sistema assim deve ser realizada
pela atual gestora a CASAN, outros tantos defendem apaixonadamente que a
municipalização deva retornar nesse caso. Cada lado com seus argumentos e
também cada um com acusações de lado a lado para justificar suas teorias
aplicáveis à demanda necessária.
Contam algumas vozes políticas de Barra Velha que diversas
empresas se apresentaram para participar do pregão licitatório no ano de 2013
para se candidatarem a gestores do saneamento, mas foram barradas pelo então
governo municipal. As mesmas também
comentam nos bastidores sobre questões de ordem financeira onde o município era
devedor de uma considerável monta de dinheiro a antiga gestora Casan, fato que
acabou alavancando a escolha dessa para continuar a administração das águas e
esgotos barravelhenses. Se as “conversa
de esquinas” são verídicas ou não pouco ajuda na problemática apresentada.
O que temos então para o momento que vivemos no presente é
que novamente volta-se a ouvir conversas nas esquinas sobre quem deveria cuidar
e administrar o sistema de águas. Também de forma tímida e bem lenta começa-se
finalmente a debater sobre o que fazer com o gravíssimo problema do esgotamento
sanitário, fato presente que provoca
debates acalorados. Lamentavelmente o nosso município, como muitos outros no
Brasil, não possui coleta e nem tratamento de águas servidas. Aproximadamente Durante
décadas a água era o assunto e o esgoto, como tudo que é sujo, foi sendo
escondido e relegado a segundo plano.
Nesse mês de abril de 2017, a Câmara Municipal de Vereadores
de Barra Velha solicitou a presença da gerência administrativa da empresa CASAN
em seu plenário para que esta realizasse explanação às dúvidas sobre
cronogramas e valores a serem investidos no município pelos próximos anos. Esse
fato não é novidade visto que na administração passada e anterior composição do
Legislativo Municipal isso já havia sido realizado algumas vezes. Pouco foi
acrescentado a tudo que já era público por ocasião da aprovação do Plano
Municipal de Saneamento, no ano de 2010. O que ficou claro na Sessão Ordinária
realizada no último dia 4 de abril de 2017 onde as respostas aos
questionamentos foram dadas aos parlamentares e público presente, foi o pouco
preparo do legislativo em formular questionamentos pertinentes ao tema e o
parco domínio sobre o assunto. O que
também ficou claro foi a pouca importância dada ao tema tratamento de esgotos.
Uma das principais funções de uma Casa Legislativa é sim fiscalizar
e cobrar metas e contratos públicos firmados. Mas espera-se que essas cobranças
venham de encontro às verdadeiras necessidades e dúvidas dos munícipes, e não
sirvam apenas para satisfazer opiniões pessoais ou políticas de parlamentares. Fica claro que essas quatro décadas que
passaram com a disputa sobre a gestão do saneamento em Barra Velha,
transformou-se em embate político-financeiro. Com a parte técnica, primordial
para o sucesso deixada de lado, meses e
até anos vão passando, angustiando cada vez mais uma população que agora se vê
literalmente cercada por um mar de esgoto.
De forma inexplicável vemos agora uma empresa gestora com
recursos captados, aprovados e prontos a serem investidos, esperando que a
morosidade política resolva quando milhões de reais serão utilizados para
benefício de toda uma população. Também
vemos que muitas decisões tomadas pela gestora do saneamento atendem mais a
interesses logísticos próprios do que as demandas da cidade e da população.
Enquanto uns querem construir uma estação de tratamento de esgotos-ETE num
bairro outros preferem que a prioridade imediata seja em outro bairro. O atendimento as demandas públicas essenciais
deve sempre priorizar o público alvo e não interesses econômico-financeiros ou
logísticos.
O fato concreto é que
no dia de hoje, em Barra Velha não existe nem um centímetro sequer de
tubulações de captação de esgotos instalada e funcionando. Nem é preciso
mencionar que nenhum processo de tratamento de efluentes, que continuam sendo
despejados de forma indiscriminada em qualquer lugar. Segundo o IBGE até
dezembro de 2016, 44,8% das cidades
brasileiras não possuíam nenhum sistema de tratamento e coleta sanitária! Atualmente
6 das 9 cidades do litoral norte catarinense não possuem nenhum sistema de
coleta de esgotos. Apenas os municípios de Itapema, Balneário Camboriu e Itajaí
tem alguma cobertura nesse serviço básico.
Cumpre citar que o planejamento do saneamento de Barra Velha
previsto no Plano Municipal de Saneamento foi elaborado pela gestão municipal
no ano de 2010, pela empresa contratada AMPLA-Consultoria e Planejamento a um
custo na época de R$ 77.400,00 e enviada ao Ministério das Cidades para
aprovação. O que destoa da rapidez no cumprimento dos prazos então
estabelecidos por este Ministério no envio do plano, são os diversos erros de
planejamento e execução operacional que este plano determina no seu escopo. Um
dos destaques negativos nesse plano é o estabelecimento da captação alternativa
de água bruta no Rio Itapocu. Importante salientar que o local escolhido e
aprovado pelos poderes executivo e legislativo municipais é equivocado permitindo a coleta de água bruta salinizada,
deixando-a inapropriada ao consumo humano. Erros desse tipo demonstram
desconhecimento ou mesmo pouco caso na importância da tecnicidade de um
processo que bem elaborado poderia já estar sendo executado a alguns anos.
Fica também o questionamento sobre o porquê da existência de
um Conselho Municipal de Saneamento, se as tomadas de decisões e ações
pertinentes não são apresentadas ao Conselho para debate e aprovação, vindo já
pré-aprovadas apenas para apreciação. Afinal entre as funções do Conselho
constam a apresentação de ideias, fiscalização, estudo de projeções e projetos
vindos tanto do Governo Municipal quanto do gestor do serviço de águas e
saneamento e resíduos sólidos. A participação e ação de um Conselho Municipal
de Políticas Públicas como auxiliar na
tomada de decisões é constitucionalmente garantido no texto da Constituição
Federal de 1988.
Todos acontecimentos até hoje evidenciam uma grande disputa
política desnecessária ao bom funcionamento desse importante sistema público. As políticas públicas nunca deveriam ser
submetidas à política partidária ou a conveniências financeiras pontuais. Os
meses e anos passam rapidamente e com o rápido aumento da população, as
demandas para suprir água, estruturas de esgotamento sanitário e outros
serviços de saneamento tornaram-se grandes problemas. O meio-ambiente e saúde
pública passam a ser sacrificados em nome de um eventual progresso futuro.
Com a retomada da prestação de serviços de saneamento básico
em Barra Velha pela CASAN em 2013 é natural que a pressão exercida pela
população na melhoria dos serviços apresentados só aumente, principalmente se
levando em conta que a nossa cidade é balneária e sofre as consequências de não
ter coleta de esgotos. Por décadas só se falava em água tratada. Agora o leque
das necessidades prioritárias aumentou drasticamente principalmente com o
expressivo aumento populacional da cidade. O fato é que o oferecimento de água
tratada não aumentou o quanto deveria apesar dos investimentos consideráveis na
ampliação da rede distribuidora de água, ultrapassando 45 km de tubulações nos
últimos 3 anos com investimentos que ultrapassam R$ 1.810.000,00. Em
contrapartida o esgoto continua a ser o “patinho feio” e nada até o presente
momento foi feito!
Fica claro que o esgoto não é e nunca foi prioridade de
nenhum governo ou gestor de sistemas de saneamento. Apenas em meados de 2016
começou um planejamento para a futura implantação de esgotamento sanitário a
ser iniciado no bairro de Itajuba. Com o projeto em fase de orçamento, o SES
(Sistema de Esgotamento Sanitário) tem a previsão de investimento na ordem de
R$ 17.238.550,00. Bairros prioritários para o saneamento por suas
características físicas como a Quinta dos Açorianos acabam por ficar relegados
a segundos planos, e sem cronogramas definidos, apesar da premente necessidade
e vontade popular.
A apresentação pública dos ativos realizados pela gestora do
saneamento em Barra Velha demonstrou esse descompasso e descompromisso com o
esgotamento sanitário. Muitas obras para a água e até agora apenas projetos
futuros para o esgoto. A CASAN está atuando em Barra Velha a pelo menos 33
anos, com mais pelo menos 27 anos pela frente. Urge que resultados muito mais
positivos sejam apresentados em curtíssimo prazo sob pena da já abalada
credibilidade fique ainda mais desgastada.
Comparativamente durante o período de aproximadamente dois anos no qual a
empresa ENOPS geriu o saneamento barravelhense, o aumento da oferta de água
tratada saltou de 60 litros por segundo para 140 litros por segundo. É sabido
que apesar de todo o tempo e investimento realizado pela atual gestora a oferta
de água tratada está no operando no limite a alguns anos propiciando até a
falta do produto quando a estiagem prolonga-se por mais de 25 a 30 dias. A insatisfação da população com a atuação da
gestão do saneamento só aumenta com os resultados apresentados. Não é de hoje
que se nota a aparência suspeita da água apresentada nas torneiras da
população. Justificar com fracos
argumentos as águas barrentas, brancas, pretas ou qualquer outra coloração que
não seja a transparência natural de uma água de qualidade não transmite e nem
aumenta a confiança dos moradores. É preciso mostrar resultados concretos que
justifiquem uma permanência de qualquer gestora num serviço essencial como a
água.
Barra Velha já sofreu muito com o tema e a solução real não
passa por vontades políticas atiradas à queima roupa. Gestão técnica, eficiente
a um custo/benefício transparente e público é a solução para que as águas de
Barra Velha fiquem transparentes da forma como deveriam ser. Disputas políticas
nada agregam e nada contribuem para que mais água e de melhor qualidade seja
ofertadas. Segundo A OMS (Organização
Mundial de Saúde) estima-se que 88 % das mortes por diarreia no mundo sejam
causadas por falta de saneamento básico adequado. Dados do SUS informam que a
média de internações por diarreia no Brasil é de 400.000 pacientes por ano. Não
temos estatísticas na cidade de Barra Velha, mas a grande incidência de doenças
de pele e manifestações gastrointestinais aqui, certamente tem como uma das
origens a problemática apresentada. Seja quem gerir o saneamento básico em
qualquer lugar, em qualquer cidade, a responsabilidade social dessa gestão
precisa priorizar a qualidade de vida.
A cidade e o país já estão atrasados no cumprimento da lei e
no quesito responsabilidade social pública. Em se tratando de um bem essencial
e que deve ser acessível a todos com qualidade então estamos ainda mais
defasados. A valorização do ser humano é a prioridade, não a logística nem as
finanças.
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